terça-feira, 29 de maio de 2007

Lutar é preciso...

Eugène Delacroix (1798 - 1863), A liberdade conduzindo o povo às barricadas, óleo sobre tela, 260 X 325 cm. Museu do Louvre.




domingo, 27 de maio de 2007

Banheiro feminino: um fato social?

Outro dia estávamos num café e o papo rolava super legal. Estava frio e eu, morrendo de fome, comi um pão de batata recheado de requeijão, que eu adoro, enquanto bebia um suco de morango com leite. A conversa estava ótima, éramos quatro pessoas, dois homens e duas mulheres e os assuntos eram os mais variados, desde os problemas da universidade pública, passando pelo caos do trânsito de São Paulo até importantes debates acerca da astrologia. Café vai, café vem, e chega o momento fatídico: uma de nossas amigas decide ir ao banheiro. Imaginei que fosse convidar nossa outra amiga para acompanhá-la, ou antes, que esse amiga se oferece de imediato para acompanhá-la. Que nada! Qual foi minha surpresa ao perceber que, sem hesitar, nossa amiga levantou-se e foi ao banheiro sozinha! Eu nunca havia presenciado isso, toda vida minhas amigas iam em dupla ao toalete, como algo dado, um fato. Assim que ela saiu, perguntei para a outra amiga: você não vai acompanhá-la? A resposta, claro, foi óbvia: "não, por que deveria? Não estou com vontade de ir ao banheiro agora". Foi então que percebi que não é uma regra. Mas, continuando a nossa conversa, percebi que isso não é bem resolvido entre as mulheres. Minha amiga continuou: "acho super chato quando estou em uma mesa e, quando uma das mulheres da mesa vai ao banheiro, me olha como se eu fosse obrigada a acompanhá-la! Houve ocasiões em que fiquei constrangida pela insistência!". Isso não é mesmo incrível? É como se não fosse permitido, socialmente, que uma mulher fosse ao banheiro sozinha, quando houvesse uma outra na mesma mesa. Só Durkheim mesmo para explicar. E tem mais, ela me disse que elas não conversam nada de mais quando vão "lá", retocam o batom e coisas assim... É simplesmente o ato de "ir acompanhada", quase um ato moral de que Durkheim fala. Por isso o título do tópico fala sobre fato social, que em linha gerais pode ser entendido como "toda maneira de agir, fixa ou não, suscetível de exercer coerção sobre os indivíduos. É geral na extensão de uma sociedade, conservando uma existência própria, independente de suas manifestações individuais. É todo conhecimento, transformação, ou situação estabelecido na sociedade."
Agora deixo a questão em aberto para as mulheres (e para os homens também claro!): o que vocês acham disso? Comentem esse tópico.

Abraços a todos!


Pierre Auguste Renoir - As Banhistas - 1887





quinta-feira, 10 de maio de 2007

Autocrítica

Já perceberam como eu não perco uma oportunidade de citar exemplos pictóricos ou artísticos nas postagens?

Tentarei me controlar.


---

quarta-feira, 9 de maio de 2007

O Papa está em São Paulo...

... ah, sim, soube...

* * *
Ok, eu ía escrever aqui um postagem super irônica para demonstrar o quanto eu não me empolgo nenhum pouco com essa "visita", onde falaria da posição ultra-conservadora desse líder religioso, aliás, conservadora não, reacionária, porque ele não quer conservar nada, mas sim reestabelecer valores ultrapassados que põem em risco uma série de conquistas da sociedade contemporânea. Mas não vou fazer isso. Esse blog tem que ser por princípio ser agradável e leve... não vou polemizar com o passeio do Papa...
Até porque, tudo tem um lado bom: foi um papa, um dos Gregórios (acho que o X), há séculos atrás, permitu que se realizassem imagens para a decoração das igrejas e para a ilustração de livros como a Bíblia. Graças a isso, a história da arte passou a contar com a arte dita sacra.
Sem isso, talvez jamais existissem obras como essas:

Leonardo da Vinci, A última ceia (1495-1497)



Rafael Sanzio, Sagrada família (1518)


Michelangelo Buonarroti, A criação de Adão (detalhe da cúpula da Capela Sistina)



Portanto, sejamos otimistas: tudo pode ter um lado bom...

Vou parando por aqui.

sexta-feira, 4 de maio de 2007

O número 7

Estamos em 2007. Uma certa operadora de celular está fazendo uma campanha publicitária utilizando o número "7": "Dê um celular novo para sua mãe, e ela falará com todo mundo por 7 centavos o minuto!". Mas parece que o tal do número 7 é mesmo cabalístico (adianto: não entendo nada de numerologia ou coisa parecida, mas se alguém souber e quiser compartilhar, escreva um comentário no final dessa postagem. Agradeço!).

Outro dia, depois de ouvir uma música que gosto muito, chamada "Den Sjunde Vågen", de Marie Fredriksson, cantora e compositora sueca, fui pesquisar e descobri que seu título signifca "A sétima onda". Na mesma hora imaginei que isso talvez fosse uma "questão sueca", pois há um filme do diretor Ingmar Bergman, lançado em 1956, que se chamava Det sjunde inseglet (O sétimo selo), história na qual um cavaleiro desafia a Morte para uma partida de xadrez - sua vida dependerá da sua vitória:

De qualquer forma, essa coisa do número 7 me intrigou... Pense bem nas coisas cujo número 7 é a base: 7 dias da semana, 7 notas musicais, 7 pecados capitais, 7 maravilhas do mundo, e por aí vai a saga do número 7. Não tenho a mínima idéia do que isso possa significar, mas que deve ter alguma relação, deve.

Selecionei aqui músicas que têm o número sete como referência:

"Den Sjunde Vågen" (The Seventh Wave)
[M.Fredriksson/L. Lindbom, 1985]

"Den första vågen när du ser på mej
Och i mina ögon finns ett svar till dej
Den andra vågen doft från ditt hår
Linjer jag kan följa minnen utav år
Den tredje vågen finns i din hand
En våg av silver som når min strand
Den fjärde vågen inifrån min själ
En våg av kärlek utan svek och skäl
Den femte vågen stormar inom mej
Lust och längtan kräver mer av dej
Den sjätte vågen blir ett med dej
Den sjätte vågen besegrar mej
Den sjunde vågen...
Ta det bara långsamt
Som dyningarna på ett hav
Ta det bara långsamt, långsamt
Världen kommer finnas kvar
Ta det bara långsamt, långsamt
"

Tradução:

"A primeira onda, quando você me olha
E em meus olhos há uma resposta para você.
A segunda onda, perfume dos seus cabelos,
Linhas nas quais percorro lembranças dos anos que se foram.
A terceira onda está em suas mãos
Uma onda de prata que atinge meu litoral.
A quarta onde, intrínseca a minh'alma
Uma onda de amor sem equívoco ou razão.
A quinta onda causa em meu interior
Desejos de ter mais de você.
A sexta onde vem com você,

A sexta onde me conquista,
A sétima onda...

Apenas a receba calmamente, calmamente
Como uma maré alta
Receba-a calmamente

O mundo esperará
Apenas a receba calmamente.
"


"Love is the seventh wave" (trecho)

[Sting, 1985]

"There is a deeper wave than this
Rising in the land
There is a deeper wave than this
Nothing will withstand
I say love is the seventh wave
"

Tradução:

"Há uma onda mais profunda que essa
Surgindo na terra
Há uma onda mais profunda que essa
Nada suportará
Eu digo que o amor é a sétima onda"


Reparem bem: as duas músicas européias, criadas no mesmo ano, têm praticamente o mesmo título: falam sobre a tal da sétima onda... que raios será isso?

Para finalizar, um música brasileira, interpretada por Renato Braz, descreve a repetição do número 7 na história da humanidade:

"7x7"
[Guinga e Aldir Blanc, intérprete: Renato Braz, 1998]

"Sete mares, sete léguas
Sete palmos, sete quedas
Sete estrelas formam a Ursa
Sete encruzilhadas
Sete veis sim
Sete veis não
Sete cores do arco-íris
Sete arcanjos, sete virgens
Sete notas na viola
Sete grãos de trigo
Sete veis céu
Sete veis chão
Sete noites que me fecho
Sete dias que me abro
Sete velas brancas
Sete candelabros
Sete foram as paixões
Sete ilusões
Sete selos, sete portas
Na hora sete vem Eva
Tenho sete namorados
Sete voltas na coleira do cão
Sete orações
Sete é o quatro da terra
Como três, luz, filho e rei
Homem de sete instrumentos
No sétimo eu descansei
Sete apóstolos pescando
No evangelho de João
Um Jesus Cristo sete vezes
Dos seus sonhos a questão
Pelos sete ferimentos
Em teu sutil coração
Eu setenta vezes sete
Preciso pedir perdão
"

Enfim, sabe-se lá se isso tem algum fundamento!

De qualquer maneira, onde há fumaça, há fogo...

Enquanto isso, a gente vai pintando o sete, sempre que possível!




*****

Nota de agosto de 2007: O diretor Ingmar Bergman, citado no início desse tópico, morreu no dia 30 de julho desse ano, uma grande perda para o cinema mundial.



*****


quarta-feira, 2 de maio de 2007

Sobre a aquarela


"Que coisa explêndia é a aquarela para expressar atmosfera e distância, de modo que a figura é envolvida pelo ar e pode respirá-lo, como de fato era."
[Vincent van Gogh, Carta 163, por volta de 18 December de 1881].



***

Desenho ou pintura? A técnica da aquarela sempre promoveu a mesma polêmica desde os primóridos da pintura acadêmica. Vista como algo inferior à pintura a óleo, essa técnica em que os pigmentos se encontram suspensos ou dissolvidos em água, nunca teve muito espaço nas grandes academias de arte.


A razão disso é que, por ser uma tinta de secagem rápida, geralmente aplicada sobre um papel de elevada gramatura, a aquarela exige um trabalho rápido e, geralmente, em pequenas dimensões. Isso, por outro lado, é sua maior qualidade. Por exigir uma aplicação rápida, a atmosfera presente nos trabalhos em aquarela são dotados de traços rápidos, ausência de contornos definidos e muita transparência, pois o branco da imagem é conseguido pelo próprio papel e a aplicação maior ou menor de tinta (ou água) nessas regiões determinará a luminosidade. Talvez por isso que Van Gogh dissesse ter a impressão de perceber o ar circular livremente ao redor da figura pintada. Veja abaixo que belo trabalho utilizando a aquarela :

Não é como se as flores e o ar se misturassem? Não se tem a sensação dessa brisa que percorre as pétalas e folhas?

Há muito tempo, quando comecei a ler sobre o assunto, vi em um manual técnico que a aquarela não é nada mais que uma mancha bem feita. Bem, de maneira geral, toda pintura é um conjunto de manchas e linhas intermediárias. Mas a particularidade da aquarela é a ausência de contornos definidos e a aplicação rápida. Talvez seja por isso que a primeira obra de arte abstrata, criada pelo pintor Wassily Kandinsky, tenha sido uma aquarela, em 1910:



Kandinsky, Primeira Aquarela Abstrata, 1910.

Outros artistas, anteriores a Kandinsky, usavam a aquarela, mas em obras figurativas, como por exemplo, Vincent Van Gogh, que criou cerca de 150 aquarelas ao longo da vida, como o trabalho abaixo:




Van Gogh, Peixes no barco de pesca, cerca de abril de 1888.

Pela natureza ágil e instantânea, além do fácil manuseio, a aquarela muitas vezes era utilizada pelos artistas como um primeiro trabalho, um esboço, para depois poderem trabalhar com calma em uma pintura a óleo, por exemplo. Os artistas que por excelência usavam a aquarela como técnica eram os pintores viajantes do séc. XIX, como Thomas Ender e Debret, que estiveram no Brasil nos primeiros anos de 1800. Ender ficou cerca de um ano no país e realizou inúmeros trabalhos, como esse abaixo:


Thomas Ender - Portal de entrada do Palácio Real de Sao Cristóvão (Rio de Janeiro)


Jean Baptiste Debret, que ficou no Brasil por quinze anos, realizou mais de 500 aquarelas sobre o país, obras que levou para a França em 1831 para publicar em seu livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil. Hoje essas aquarelas estão no Museu da Chácara do Céu, no Rio de Janeiro (na postagem anterior há outras informações sobre Debret).

Enfim, independente do status atribuído à pintura com aquarela, trata-se de uma técnica única, dinâmica, cujos trabalhos resultantes são sempre transparentes, luminosos e coloridos. Um outro detalhe: toda aquarela é efêmera, não é feita para durar para sempre: o tempo a descolore, uma gota d'água pode destruí-la. Por tudo isso, pela beleza e pela fragilidade, é que a aquarela é uma metáfora da vida: pode até não ser eterna, mas a sua beleza é indiscutível. Pelo menos para mim.

"Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá. O fim dela ninguém sabe bem ao certo onde vai dar. Vamos todos numa linda passarela de uma aquarela que um dia enfim descolorirá".

[Aquarela. Toquinho/Vinicius de Moraes]

Albert Dürer, Lebre jovem, 1502, Aquarela e gouache em papel.

Debret

Gostaria de escrever todos os dias nesse blog. Mas isso não seria bom: acabaria se tornando uma obrigação, uma busca louca por assuntos, na tentativa de ser original eu acabaria me chateando e desistindo. Por isso, quando sento aqui é porque tenho realmente algo a dizer. Hoje quero falar um pouco sobre Debret. Você o conhece ?

Jean Baptiste Debret era um pintor, nasceu em Paris em 1768 e morreu nessa mesma cidade em 1848. Ele vivenciou toda a turbulência da Revolução Francesa, sendo um pintor engajado, tornando-se, em seguida, um dos artistas que serviam a Napoleão Bonaparte, para quem realizou muitos quadros... Mas Napoleão não foi imperador por muito tempo, e quando ele perdeu o poder, Debret, assim como vários companheiros, não tinham mais terreno profissional na França, e ele acabou vindo trabalhar no Brasil. Sim, no Brasil, como pintor da Corte de nosso primeiro rei, d. João VI.
Estamos no ano de 1816, e o Brasil era então um Reino; d. João, ainda príncipe regente, entendeu que seria uma boa idéia criar uma escola de Belas-Artes (essa história é um tantinho mais complicada, mas aqui não seria o lugar de aprofundá-la... tem um bocado de livros sobre o assunto por aí, outra hora eu indico - me lembrem!). Um grupo de franceses, que ficou conhecido historicamente como Missão Artística de 1816, foi contratado para realizar essa tarefa - e entre eles estava Debret, o pintor de história (um pintor desse tipo realizava trabalhos cujos temas eram sempre cenas gloriosas, de batalhas, conquistas, ou mesmo cenas da bíblia ou da mitologia; também incluíam-se no rol de temas cenas de importância política, como coroações, por exemplo). Com isso Debret foi um dos nossos primeiros pintores de Corte, e nessa tarefa realizou vários retratos de nossa monarquia, bem como criou várias imagens sobre acontecimentos oficiais, como coroações, batizados e outros festejos reais.
Fora isso, Debret também criou muitas imagens sobre o Brasil, não apenas sobre os monarcas, mas também sobre a vida cotidiana no Rio de Janeiro da época, que era composta, em grande parte, pelos escravos que povoavam as ruas.
A obra de Debret, portanto, revela tanto a vida dos grupos de elite quanto da população mais pobre, e esse contraste é o que há de mais rico em sua obra. Talvez por isso Debret tenha sido minha companhia durante o mestrado, e hoje ainda tento estudar a sua importância para a imagem que temos do nosso próprio passado.

Confira a análise que faço de uma aquarela de Debret no artigo:

(Atualização em 13/06/2013) - E aqui, minha tese de doutorado sobre o pintor: Velhas imagens, novos problemas: a redescoberta de Debret no Brasil modernista.


É isso.