domingo, 10 de junho de 2018

Palavras, coisas e imaginação: Esplendor (2017)

Esplendor (Hikari, 2017, direção de Naomi Kawase) é um filme sobre audiodescrição. A maneira como ele coloca a questão faz pensar sobre os limites entre as linguagens, sobre a irredutibilidade entre elas. Como já nos alertava Foucault, na introdução de As palavras e as coisas, na instigante análise que faz do quadro Las meninas, de Velázquez: "(...) por mais que se tente dizer o que se vê, o que se vê jamais reside no que se diz (...)".* E o filme é brilhante na busca dessa (im)possibilidade comunicativa. A personagem responsável pela audiodescrição percebe, logo no começo, que suas palavras, na intenção de um descrição detalhada, acabam sendo excessivas ou invasivas, e não permitem que seu público alvo imaginem. Vale lembrar que a memória e a imaginação, como nos lembra Francastel, são fundamentais para tornarem vivos um quadro ou um filme**. A história é a apresentação da aprendizagem da personagem sobre os limites e possibilidades da audiodescrição. E nessa aprendizagem, ela aprende, também, muito sobre si mesma.



Notas:
* M. Foucault. As palavras e as coisas. São Paulo: Martins Fontes, 1981, p. 25.
** P. Francastel. Imagem, visão, imaginação. Lisboa: Edições 70, 1983, p.167.