segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Tio Nenê

Hoje numa discussão de um grupo de pesquisa que participo, falamos nos apelidos da infância, aqueles pelos quais éramos chamados nos primeiros anos de nossa existência. Hoje meu apelido é Dê, uma abreviação criativa de Anderson, feita pela minha irmã e que "pegou". Eu gostei, pois meu apelido anterior era o constrangedor "Nenê". Quando comecei ir para a escola, morria de medo de alguém descobrir esse infame vocativo, comum àqueles que são a "raspa do tacho", como de dizia sobre os caçulas, sobretudo temporãos, como foi o meu caso. Mas isso não quer dizer que gostasse do meu verdadeiro nome - como ninguém em casa me chamava por ele, e até hoje não o fazem, sempre achei estranho ser chamado assim, e mesmo dizer meu nome em voz alta era algo esquisito. Demorei para me acostumar. Nenê era bem estranho, mas eu me identificava com ele. O mais engraçado é que eu era novinho e tinha sobrinhos de idade próxima, e alguns deles me chamavam de "Tio Nenê". Hoje, olhando em retrospecto, acho bem bonitinho. Essa coisa de ser tio desde os dois anos de idade imprimiu em mim certa responsabilidade, da qual nunca me distanciei, o que, de certa forma, foi bom, imprimiu o que considero alguns traços interessantes de caráter, embora tenha me privado, em muitos momentos, de ser a criança da idade que eu tinha, para cuidar dos sobrinhos... mas nada muito grave. Aos 10 anos praticamente ninguém em casa me chamava mais de Nenê, e Dê foi se tornando meu nome, e até hoje os amigos assim me chamam. Alguns parentes, com os quais tenho menos contato, ainda me chamam de Nenê, e acho estranho. Gosto do apelido monossilábico que tenho há mais de 30 anos. Quanto a Nenê, hoje me voltou numa lembrança despertada no grupo de pesquisa, e foi uma lembrança cheia de ternura. A idade tem lá suas vantagens, e aos 43 me reconcilio com essa parte de minha identidade. Mas, por favor, me chame de Dê.



Trilha sonora agorinha: Go to sleep (Roxette, 1994).

https://www.youtube.com/watch?v=gKvatxuIk60

quinta-feira, 27 de maio de 2021

Mente sã etc.

Mente sã, corpo são. Sempre achei essa frase interessante, mas não sei bem se a relação causal é adequada. Hoje estava lendo um texto* que falava sobre como nossos corpos não são meros resultados dos processos sociais, mas também constroem e transformam a sociedade. O fato de darmos sentidos ao ser biológico que somos não faz com que deixemos de ser orgânicos. E, dentro disso, oscilamos entre saúde e doença o tempo todo de nossa existência. Portanto, cuidar do corpo é importante; a mente também é corpo, afinal de contas, e essa separação, quanto muito, é teórica. Mas o fato é que nunca gostei de praticar exercícios físicos. Nunca. O que não significa que não tenha praticado esportes na infância ou adolescência, mas sim que nunca gostei de academias, nem mesmo de correr por aí. Caminhar é o que me diverte e isso sempre fiz, mas sem regularidade. Daí veio a pandemia e, com ela, vários quilos a mais. Eu já vinha apresentando um histórico de desequilíbrio metabólico, se posso chamar assim meu colesterol ter subido a níveis preocupantes, a ponto de um cardiologista me receitar remédio alopático. Pensei seriamente em fazer uso disso, tendo em vista um histórico familiar preocupante. Mas o meu médico de sempre, aquele que me acompanha, me disse para não fazer isso e, ao invés, levar a sério uma reeducação alimentar, praticar exercício físico e passar a tomar um remédio fitoterápico (ele é adepto da medicina não ocidental). Nunca na vida consegui fazer qualquer dieta, por isso fomos a uma nutricionista, que nos mostrou um caminho bem tranquilo para isso, sem cortes radicais, mas com atenção à moderação e inclusão de fibras na alimentação: leia-se: frutas, legumes, verduras, grãos e lácteos. Sem tirar o sagrado arroz com feijão que amo e é a base da minha alimentação. Essa dieta suave, mas caminhadas regulares (em uma esteira ergométrica, pois não gosto de sair caminhar durante a pandemia), fez com que, em quatro meses, perdesse 8 quilos na balança e quase 100 pontos nos níveis de colesterol, além do reequilibro em vários outros índices. Nesse dieta, uma das maiores recomendações da nutricionista era diminuir ao máximo o vinho. Realmente, isso não aconteceu, talvez um pouco, mas nem perto do que ela gostaria (meia garrafa por semana!). No fim, penso que a alegria proporcionada pelo vinho, que tanto amo, foi um ingrediente importante para a saúde do espírito, da mente, e, consequentemente, do meu corpo. De modo que percebi que é possível, mesmo após os 40, se reeducar. Foi realmente um processo transformador. E, sim, estou muito feliz de poder vestir novamente algumas camisas que estavam no guarda-roupas há anos. 


Olivia Newton-John - Physical (1981)



* CONNEL, Rayween, PEARCE, Rebecca. "Corporificação social e arena reprodutiva". In: Gênero: uma perspectiva global. São Paulo, nVersos, 2015.


quarta-feira, 26 de maio de 2021

Trabalho

Muitas vezes me pego ansioso ou angustiado por conta de tarefas a realizar. Às vezes, acordo de manhã e, entre o do despertador, quando que penso em dormir mais 10 minutos, e o susto relacionado ao trabalho por realizar, dou aquele pulo. É algo muito curioso isso, o modo como tentamos a todo tempo enlouquecer (eu sei que existe um conceito psicanalítico para isso, mas nem vou me arriscar aqui). Quando penso em minha agenda, fico com medo de não dar conta das tarefas, mas olhando para o passado, em perspectiva, sempre foi assim, desde a faculdade, pelo menos. E tudo sempre foi realizado, de um jeito ou de outro. Tem horas que penso que a agonia é o tempero que dou ao meu trabalho, de modo a dar mais emoção às coisas, sei lá... claro que falo disso na minha terapia. Tive uma criação na qual o trabalho era imensamente valorizado, e carrego isso comigo. Estar aqui, por exemplo, escrevendo um post, me faz oscilar entre o prazer da escrita e a culpa por não estar fazendo algo mais produtivo ou relacionado às minhas obrigações. Mas lembro do tempo do meu doutorado, em que esse blog bombava, e sempre foi um modo de organizar as ideias e treinar a escrita, algo que, de todo forma, ainda compõe a maior parte dos meus afazeres. Escrever é uma terapia em si, e sempre foi uma ferramenta poderosa na minha constituição. Por isso, talvez, esse blog ainda exista. 

sábado, 15 de maio de 2021

O que você realmente deseja?

Tenho assistido a uma série chamada Lúcifer.* Não é lá grande coisa, mas tem sido um passatempo gostoso, leve, despretensioso, para ver durante o almoço, na hora do cafezinho. Tudo, porém, pode ser mais interessante do que parece à primeira vista. Lúcifer, o anjo caído dono de um nightclub em Los Angeles, se aproxima de uma detetive por quem, aparentemente, tem alguma ligação transcendental e acaba se tornando seu parceiro na luta contra o crime. A trama é simples e nem de longe se assemelha aos seriados policiais diversos e renomados no estilo CSI que há anos são consagrados pelo público. O mais interessante em Lúcifer, porém, é seu poder, que consiste em saber o desejo mais profundo das pessoas. Sua pergunta "o que você realmente deseja" torna-se, muitas vezes, a chave para a solução dos crimes. Parece bobo, mas comecei a exercitar comigo mesmo o que eu diria se Lúcifer me perguntasse isso. Claro, há inúmeras coisas obvias que vêm à mente, mas será que paramos para nos fazer essa pergunta no dia-a-dia? Hoje, por exemplo, eu fiz várias coisas que queria fazer de fato, muitas delas relacionadas ao trabalho, coisas bacanas que me fizeram feliz. Depois disso, pensei em dar uma corridinha na esteira, meu único exercício físico regular na pandemia, pelo menos desde janeiro. Daí pensei: "Será que é isso mesmo que eu quero fazer? O que, de fato, eu desejo fazer, agora?" E era tomar um banho quente, pedir uma pizza e escolher um filme para a noite de sábado. Abrir um vinho também apareceu nesses planos. Fiquei feliz demais com essa decisão, e sobre como não me violentei fazendo algo que, hoje, não, era meu desejo. Assim, num seriado água com açúcar cheio de clichês e um roteiro bem fraquinho, encontrei algo interessante e que pretendo exercitar cotidianamente. Parece simples, mas, pergunto: o que você realmente deseja? Vai ver que a resposta pode ser bem difícil de se dar, assim, de supetão.



"Agora descubra de verdade o que você ama, que tudo pode ser seu" 

(Marina Lima. Pra começar.)



https://pt.wikipedia.org/wiki/Lucifer_(s%C3%A9rie_de_televis%C3%A3o)



segunda-feira, 19 de abril de 2021

Trabalho, trabalho, trabalho

Hoje foi um dia te intenso trabalho. Amanhã também será. Agenda cheia. Cansa bastante. Tem horas que eu me pego pensando sobre o sentido de tanto esforço. Tem segundas-feiras que acordo como que enfrentando a semana que mal começou como um desafio. Mas que fique claro: trabalho em algo que gosto, que me realiza, que sempre busquei como profissão. Como reclamar? É um dilema que vivo, afinal, como reclamar de algo que sempre sonhou fazer? Mas não é isso. Não é reclamar. É refletir sobre as escolhas, os caminhos, as verdadeiras opções dentro de um emaranhado de caminhos entrecruzados. Sou docente no ensino superior público estadual, um sonho realizado em 2016; coordeno um curso de graduação; tenho um monte de orientandos, mas penso em não ter novos por um tempo, dada a responsabilidade que essa tarefa traz e o tempo que ela demanda de atenção; realizo uma pesquisa individual para a qual sou financiado e tenho uma bolsista que me ajuda; fora isso, estou em outros dois projetos de pesquisa como professor associado. Adoro fazer pesquisa, adoro lecionar (sim, estou dando um bocado de aulas, também), adoro orientar pesquisas. Gosto muito de participar da gestão da universidade - comecei minha carreira na área administrativa e tenho certa desenvoltura nisso. Então, na verdade, o que me faz sofrer não é o trabalho, que gosto e com o qual me identifico, mas sim a possibilidade de, diante de tantas tarefas, não fazer um bom trabalho (dentro dos meus critérios). No fundo, é cobrança, a boa e velha cobrança, que tanto nos atormenta. Claro que esse é um assunto corriqueiro em minhas sessões de terapia - aliás, como alguém não faz terapia em uma época como a nossa? Enfim, hoje foi um dia daqueles, mas quando ele acaba, como agora, sinto a alegria de ter feito o melhor, em tarefas que me aprazem. Dentro disso, sei que sou um privilegiado. Não por ter um emprego considerado "bom", mas por me encontrar nele. Pois muita gente sofre, mesmo em empregos considerados "bons". O fato é que a vida é complicada, e ela tem estado bem mais assim ultimamente. Estamos em 2021, e se você não sentiu nenhum tipo de inquietação, seja com sua vida, seja com a vida ao seu redor, então seu problema é bem maior que o meu, que se resolveu (ao menos hoje) apenas escrevendo isso aqui! 

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Trilha sonora: https://www.youtube.com/watch?v=ARvSDkcm0k8


Marie Fredriksson. Tro (1996)

terça-feira, 6 de abril de 2021

Dias de chuva

A mistura de alegria e tristeza que vem com os dias de chuva é algo ímpar. Mas, no geral, eu adoro. Hoje está um desses dias cinzas e com chuva contínua. Friozinho, depois de várias semanas de intenso calor. O outono chegou dizendo a que veio. Home office com chuva é algo estranho e perigoso, com o sofá a 5 passos da minha escrivaninha! Mas a agenda me lembra que, até o final do dia, é por aqui que ficarei. Mas na companhia de uma gostosa chuvinha lá fora, que lava a alma e leva as tristezas de uma época como esta. Santa chuva.


Músicas com chuva no título que me vêm à cabeça agora:

Santa Chuva - Maria Rita

The Rain - Roxette

Queen of Rain - Roxette

Watercolours in the rain - Roxette

Waiting for the rain - Roxette

Pocketful of Rain - Roxette

Rain - Madonna

Have you ever seen the rain? - Creedance

Det regnar igen - Marie Fredriksson

Here comes the rain again - Eurythmics

Chuva de prata - Gal Costa







sábado, 3 de abril de 2021

O tempo e as paixões: sobre a fidelidade

Já escrevi aquihá muito tempo, sobre o impacto da passagem do tempo, mas, claro, sempre numa perspectiva individual e assim será aqui, novamente. Farei 43 anos este mês e é muito interessante que, agora, quase tudo que tem a ver com minha história já é em termos de "longa duração". Meu casamento: 22 anos; Joyride, do Roxette, completou 30 anos em março (foi o disco me tornou fã da banda); esse ano faz 20 anos da minha formatura na faculdade; minha gata faz 15 anos mês que vem; estou no meu "novo" emprego faz quase cinco anos... enfim, tudo parece fazer muitos anos a partir de certo ponto, e isso é muito interessante. Comecei a ter essa percepção por vota dos 35, e na época me assustou um pouco. Agora lido bem e acho uma vantagem - a maturidade tem seus encantos e fortalece alguns aspectos da existência. Por outro lado, eu fico me assustando com certos apegos que tenho com coisas antigas - parece que minhas músicas e filmes favoritos são todos de 2010 para trás. Mas apenas parece. A verdade é que a gente vai ficando mais seletivo com as novas paixões, e precisa de muito arroz com feijão para entrar na nosso Top List. Bem, ao menos comigo é assim. Sei que ainda estou jovem, e que aos 60 novas percepções surgirão. Espero estar vivo e com saúde para voltar aqui e escrever... porque, me conhecendo, se tudo permitir, sei que ainda estarei com esse blog ativo. Sou fiel aos meus amores.

 

Pato Fu - Sobre o tempo.



sexta-feira, 2 de abril de 2021

O mês do lagarto

Abril é quando faço aniversário. Talvez seja por isso que gosto do mês, mas talvez não seja apenas por isso. Lembro de ler em algum livro do Lobato, talvez o Reinações..., que abril é o mês do lagarto: nem muito quente, nem muito frio, nem muita chuva, nem muito sol... é quando todos no Sítio do Pica-pau Amarelo ficavam sem fazer nada, como lagartos ao sol. De fato, convenhamos, essa atmosfera outonal é gostosa demais, um cheiro de novidade, de limpeza, uma luz única, o céu mais azul do que nunca, e as nuvens brancas como algodão. Só abril é assim. E nesse eu faço 43 anos. Vou me permitir falar apenas de coisas boas nesse post, embora a realidade lá fora dificulte isso. Mas vou, é meu aniversário, e espero estar feliz e com saúde nele! Quero comemorar com meu marido e minha gata, comer bem, tomar um bom vinho, ouvir música na vitrola, ver um bom filme. É o que dá pra fazer, e isso já me deixa bem feliz. As coisas não felizes eu esqueço um pouquinho - esse vai ser meu presente para mim mesmo. Vou fazer 43 anos! Não é incrível?


April clouds (Roxette, 2016)